Acordei cedo como de costume, acendi a luz do quarto e não acreditei quando vi algo pequeno se mexendo na parede. Coloquei a luz do celular e a minha dúvida se confirmou. Era bedbug!
Consegui tirar uma foto e tentei matá-lo, mas ele pulou da parede. Levantei o colchão e vi outro. Fui rapidamente ver minha mochila e outro andava por ali.
Rapidamente executei o protocolo “Chinche”. Como minha mochila estava fechada e em cima de uma cadeira, era certo que estava a salvo. Mas as roupas que tinha lavado no dia anterior e as do corpo não estavam garantidas.
Separei as roupas em uma sacola, fui tomar banho e separei as roupas que usava. O saco de dormir também foi separado, como também a toalha e as meias. Ainda bem que carrego três conjuntos de roupas, justamente para esse tipo de emergência.
Minha mochila já se encontrava fora do quarto e as roupas acondicionadas em sacos fechados. Agora o problema era encontrar uma lavanderia em Póvoa de Varzim.
Ouvi barulho no quarto da canadense, mas não quis importunar, talvez ela tenha passado essa noite a salvo. Estava muito preocupado e segui adiante para a lavanderia.
Eu tinha ouvido falar sobre a infestação de chinches no albergue de Póvoa de Varzim em Vila do Conde, mas como eles haviam tomado todas as providências para abertura do albergue, cobrindo os colchões com capas e feito toda a dedetização e limpeza do local, então para mim estava tudo certo.
Antes de sair do albergue, deixei um bilhete para a hospitaleira avisando o que eu havia visto. Inclusive recomendando que o quarto não fosse usado para que outros peregrinos não tivessem problemas também.
Ao descer perguntei a primeira pessoa que vi na rua a localização da lavanderia, acabei encontrando respostas no hotel próximo ao albergue. Não era longe e ficava ao lado do Café chamado Brasil.
Achei graça na hora, isso era um bom sinal, não tive dúvidas e segui para lá. A lavanderia estava fechada, mas o café não. Aproveitei para tomar o primeiro pequeno almoço do dia.
O dono e outro cliente conversaram bastante comigo. Típica conversa de bar e sobre curiosidades do Brasil de quando eles haviam visitado muitos anos atrás. O cliente disse que bedbug é chamado de perdigueiro por aquelas bandas, não fazia mal algum e era comum por ali.
Se ele soubesse o quantos peregrinos desistiram de suas peregrinações por causa desse percevejo... Lembro bem de um peregrino americano que em 2011, estávamos em Burgos, Caminho Francês, ele teve que retornar pra casa por estar todo picado e sem condições pra continuar, outra vez em 2012 no Caminho do Norte, uma peregrina suíça que também não teve muita sorte e tinha muita dificuldade de se hospedar nos albergues públicos. Sem falar de inúmeras histórias de albergues fechados em todos os Caminhos por causa dessa praga.
Assim que a lavanderia abriu, às 09h30min, comecei o que chamo de protocolo “Chinche”. Fiz várias pesquisas sobre o assunto antes de sair do Brasil, como já havia escutado que havia um surto nos albergues pelos Caminhos foi que resolvi me inteirar mais sobre o assunto.
Infelizmente não encontrei nenhuma solução para aniquilar de vez o inseto, mas alguns sites dão dicas para o tratamento de roupas que podem ter tido contato com eles. Aparentemente é tudo muito simples e basicamente é lavar as roupas em alta temperatura na máquina de lavar.
Como separo todas as peças de roupa em sacos zip-loc, a possível infecção de todas as roupas é quase que impossível. Mas uma conferida visual é sempre bom para garantir!
Primeiro lavar todas as roupas em água quente e depois colocar na máquina de secar na temperatura mais alta, para garantir é melhor secar duas vezes. Quando todo o processo acabou já eram meio-dia, um pouco tarde para iniciar a etapa. Mas antes tarde do que nunca!
Antes de deixar Póvoa de Varzim passei numa lanchonete para fazer o segundo pequeno-almoço do dia, afinal pra que a pressa?! Na verdade já estava com fome e com certeza não haveria muitas opções, então mais uma vez utilizei o bom senso e reforcei o estômago.
Agora era uma corrida contra o relógio para chegar a Esposende. Em si, o Caminho não era difícil, a primeira seta amarela aparece logo nos primeiros metros do calçadão da praia e novamente é só seguir todo o tempo pela costa.
A desvantagem de sair nas carreiras para cumprir a etapa é que não se tem muito tempo para aproveitar a paisagem, desfrutar, como os espanhóis sempre falam... “O peregrino antes de tudo deve desfrutar do Caminho!”
E realmente, esse é um conselho que todos devem seguir ao peregrinar pelos Caminhos rumo a Santiago de Compostela, pois torna a peregrinação mais leve e muito mais interessante. Não precisa ser só bolhas nos pés e dores no corpo!
Uma das melhorias que estão realizando nas praias da Costa Portuguesa é a construção de passadiços sobre as dunas, isso ajuda a preservação das mesmas, mas também ajuda ao caminhante e assim rapidamente fui cobrindo os quilômetros da etapa. O sol também seguia o meu ritmo e baixava na mesma velocidade no horizonte.
Cheguei à localidade de Fão e vi uma placa indicando um albergue e quase não acreditei, pois já era noite. Albergue a 20 metros, depois de andar 20 quilômetros sem parar era quase um milagre aquela informação.
Realmente foi pura sorte ter visto aquela placa, pois só parei um instante pra tirar fotos de uma igreja e só a vi por isto. O albergue da juventude fica situado bem ao lado da Igreja do Bom Jesus e um pouco recuado, quase que escondido.
Pelo horário e escuridão a decisão mais correta era encerrar a etapa por ali, os sete quilômetros que restavam teriam que ser incluídos na próxima etapa, pois não tinha muitas informações de hospedagem e pelo que me disseram o próximo albergue só em Viana do Castelo.
As Pousadas da Juventude são muito comuns em Portugal, com o valor acessível de apenas €9 para o peregrino e com café da manhã incluso. Não é um albergue de peregrinos, mas melhor é impossível!
O quarto é composto de dois beliches e separados por sexo, mas como estávamos na baixa estação acabei ficando sozinho no quarto. Retirei tudo da mochila para verificar os sacos de cada roupa e graças a Deus nada encontrei. De certa forma foi a melhor decisão lavar toda a roupa, não ia correr o risco de levar essa praga comigo na mochila e contaminar outro albergue.
Com esse desencargo de consciência fui atrás de algum local para comer. O vilarejo de Fão não é muito grande, mas possui uma boa variedade de restaurantes, além de farmácia e comércios. Não fui muito longe e entrei no primeiro restaurante que vi... Bem estiloso o ambiente e com preços muito atraentes.
Ao voltar encontrei uma peregrina irlandesa, estava fazendo o Caminho da Costa ao revés e já tinha feito o Caminho Português Central para Santiago. Comentou sobre o mal tempo e a falta de sinalização do Caminho da Costa, falei pra ela que era só seguir a costa sobre as dunas.
Fiquei de passar algumas informações para ela no dia seguinte, pois eu tinha alguns panfletos comigo, estava muito cansado naquele momento, desejei-lhe boa noite e nos falaríamos no dia seguinte.
O dia foi puxado e apesar do susto logo cedo deu tudo certo no final. A estratégia para a próxima etapa é acordar cedo para tirar a diferença dos quilômetros não percorridos no dia de hoje.
Uma das americanas me enviou uma mensagem de Esposende perguntando se eu estava bem, ela havia encontrado a peregrina canadense e as duas estavam em Marinhas.
Combinamos de nos encontrar em Viana do Castelo, local da nossa próxima parada. Estamos cada vez mais perto de chegar a Galícia e o Caminho da Costa está chegando ao seu final, quando se encontra com o Caminho Português Central em Redondela.
Enfim, é melhor descansar que a próxima etapa vai ser longa. Viana do Castelo estou chegando!