A queimada é uma bebida alcoólica típica da Galiza, elaborada com aguardente queimado e açúcar, aos quais é adicionada também casca de limão ou laranja, grãos de café e outros ingredientes que variam de acordo com o preparador.
A primeira vez que vi e bebi uma Queimada foi no Albergue de São Pedro de Rates, no Caminho Português em 2011. A segunda foi em 2012, num Café-Bar na Praza de Quintana em Santiago.
Duas experiências interessantes de confraternização peregrina ao redor de um enorme caldeirão de barro que aos poucos foi se incendiando.
O preparador ia meio que cantando e esconjurando uma antiga canção medieval enquanto ficava mexendo a poção alcoólica em seu caldeirão de barro.
Particularmente, a primeira vista eu me sentia numa roda de bruxos em convenção anual, tipo Diário de um Mago, mas tudo não passa de encenação e brincadeira.
A queimada tem origem na época medieval embora também seja atribuída aos celtas, segundo a lenda, a canção e a bebida protegem contra feitiços e mantém afastados os espíritos e demais seres do mal daqueles que participam do ritual.
No entanto, a queimada tradicional da era medieval era bastante diferente da que hoje se consome no Caminho de Santiago.
Caso tenha interesse em conhecer a Queimada Galega, procure alguém com experiência para realizar o preparo, visto que o perigo de se queimar é muito grande!
O ritual da preparação está dirigido a afastar os maus espíritos e as meigas (bruxas) que espreitam o Caminho do viajante.
Qualquer ocasião é boa para realizar uma queimada: uma festa, reuniões familiares ou de amigos e no Caminho de Santiago.
Após a ceia, na obscuridade da noite, que é um bom momento para realizá-la, os participantes reúnem-se ao redor do pote no qual se elabora, preferivelmente com as luzes apagadas.
Um dos presentes é encarregado de dar o toque final, erguendo com uma concha o líquido em chamas e deixando-o cair pouco a pouco no recipiente enquanto pronuncia o esconjuro.
Os seus ingredientes principais são a aguardente e o açúcar, aos que geralmente é adicionada também casca de limão ou laranja.
Também podem ser adicionados alguns grãos de café sem moer, pedaços de maçã e uvas, os quais se acrescentam de forma independente segundo a tradição de cada região.
Num pote de barro cozido, botam-se a aguardente e o açúcar na proporção de uns 120 gramas deste por litro, os demais ingredientes e mexe-se tudo.
Na concha, de preferência também de barro, colhe-se uma pequena quantidade de queimada, sem limão nem café, molham-se os bordos da concha com a bebida e ateia-se fogo.
Enquanto está ardendo, mete-se a concha no recipiente grande até se estender o fogo por toda a superfície.
A seguir, mexe-se devagar, deixando que subam as chamas do álcool, criando cascatas com elas.
Mexe-se até se esgotar quase todo o álcool, fazendo que a queimada se apague por si só, à exceção das bordas do caldeirão, que normalmente não se apagam.
Durante todo o processo se quando se recita o esconjuro.
A queimada é servida quente, sem ser retirado nenhum dos ingredientes.
O esconjuro da queimada foi escrito por Mariano Marcos Abalo em 1967 e revisto em 1974.
"Queimada a arder, Pequena queimada.
Mochos, corujas, sapos e bruxas.
Demônios, trasgos e diabos, espíritos das enevoadas veigas.
Corvos, píntigas e meigas, feitiços das mezinheiras.
Podres canhotas furadas, lar dos vermes e alimárias.
Fogo das Santas Companhas, mau-olhado, negros feitiços,
cheiro dos mortos, trovões e raios.
Uivar do cão, pregão da morte, focinho do sátiro e pé do coelho.
Pecadora língua da má mulher casada com um homem velho.
Averno de Satã e Belzebu, fogo dos cadáveres ardentes,
corpos mutilados dos indecentes, peidos dos infernais cus,
mugido do mar embravecido.
Barriga inútil da mulher solteira,
falar dos gatos que andam à janeira,
guedelha porca da cabra mal parida.
Com este fole levantarei as chamas deste fogo que assemelha o do Inferno,
e fugirão as bruxas a cavalo das suas vassouras,
indo se banhar na praia das areias gordas.
Ouvi, ouvi!
Os rugidos que dão as que não podem deixar de se queimar na aguardente,
ficando assim purificadas.
E quando esta beberagem baixe pelas nossas goelas,
ficaremos livres dos males da nossa alma e de feitiço todo.
Forças do ar, terra, mar e fogo, a vós faço esta chamada,
se é verdade que tendes mais poder que a humanas pessoas,
aqui e agora, fazei que os espíritos dos amigos que estão fora,
participem conosco desta Queimada."