Após três dias de descanso, recuperação, reflexão, oração e paz é hora de retornar ao Caminho rumo à Santiago de Compostela. Três dias é o máximo que um peregrino pode ficar no albergue de acolhimento em Fátima sem pagar nada.
Por incrível que pareça nem donativo é possível deixar ali, o local é destinado a todos os peregrinos que chegam ao Santuário a pé ou de bicicleta. É claro que a prioridade fica para os peregrinos que chegam a pé, mas sempre há espaço para todos.
Uma ultima visita ao Santuário ou uma passada nos Correios para despachar algum peso extra para Santiago ou para o Brasil não é má ideia.
A primeira seta amarela indicando o Caminho fica logo depois da rotatória que se encontra em frente ao estacionamento por detrás do Santuário. Agora as setas se acompanham em sentidos contrários e seguirão assim até a divisa entre a Espanha e Portugal.
Quando o peregrino atravessa a fronteira entre os dois países a frequência das setas azuis é menos, mas ainda pode ser vista em alguns locais de maneira bem discreta.
Esta etapa não é longa, segue os padrões de quilometragem do Caminho Francês, mas infelizmente não há muito pra se ver ou para comprar mantimentos no Caminho, então o jeito é sair de Fátima com a mochila um pouco mais pesada, com comida e água suficientes até chegar a Caxarias.
A vantagem é que o Caminho Português rumo à Santiago de Compostela a partir do Santuário de Fátima segue por estradas mais tranquilas e pela área rural, o que torna a caminhada bem melhor e prazerosa.
A primeira surpresa surge logo no primeiro quilômetro quando as setas seguem em direção à trilha paralela a estrada de asfalto, onde é possível encontrar uma fonte de aguas naturais recuperada em 99, não que o acesso às águas da fonte, pois creio que são subterrâneas.
Outra surpresa surge um pouco mais a frente, uma pequena cascata descendo pelas rochas e que se perde pela densa mata que se encontra na lateral da trilha.
Essa etapa tem um pequeno problema com a sinalização, não que a mesma não exista, mas é bem mais escassa do que as etapas anteriores. Outra coisa também é um sobe e desce morro que não tem fim, às vezes a sensação é de andar em círculos, mas só sensação.
Uma coisa bem interessante dessa região é que para onde você olhar encontrará oliveiras, e se for à época da colheita também encontrará um fluxo grande de caminhonetes carregando azeitonas para a Cooperativa da região. Só uma dica, não vá comer azeitona direto do pé, o gosto não é nada agradável!
Digo isso por que eu sou matuto de cidade grande e nunca havia provado, nem sabia que depois de colhida elas eram perfuradas e colocadas de molho em água para ficarem com o gosto melhor, em alguns casos ou na maioria, colocam de molho com água, sal e condimentos.
Apesar de curta a etapa, eu tive a oportunidade de testemunhar a solidariedade dos moradores locais. A primeira e debaixo de muita chuva, uma senhora passava de carro e me ofereceu uma carona, é claro que tive que recusar, afinal a única preocupação de um peregrino é caminhar.
Ela seguiu em frente e depois de 30 minutos me encontrou novamente na estrada e me deu alguns mantimentos, água, sanduiche e frutas. Fiquei bem impressionado com o gesto daquela senhora e agradecido, é claro que eu carregava comigo mantimentos, mas isso não se vê todo dia, não é mesmo?!
Após conversarmos algum tempo, eu debaixo de muita chuva e ela dentro do carro, ela me presenteou com duas medalhas de São Bento, uma para mim e outra para presentear quem eu quisesse. Mais uma vez agradeci e segui o meu Caminho.
A segunda vez foi quando eu inventei de provar uma azeitona roxa diretamente da oliveira. Nossa Senhora! Nunca havia provado algo tão ruim em minha vida!
Um senhor que estava colhendo as azeitonas viu a cena e me explicou todo o processo para tornar as azeitonas comestíveis. É claro que ele me ofereceu algumas que já estavam prontas para serem comidas, não que eu tivesse fome, mas muita curiosidade para sentir a diferença da que eu havia comido anteriormente, e que diferença!
Enfim, a etapa não oferece muita dificuldade e nem muitas paisagens bonitas, apenas muitas Oliveiras no Caminho. Muitas mesmo!
Outra coisa, essa talvez não seja muito interessante é que todo o Caminho segue principalmente a já conhecida N356 até a Igreja Matriz de Caxarias. Ou seja, muito asfalto e se tiver fazendo sol, muito calor!
Essa etapa foi feita em 07h37min, caminhei ainda com bastante dor na perna direita. Tive bastante tempo para refletir sobre o meu ritmo de caminhada até Santiago, pois eu já havia sofrido bastante em 2012 de tendinite no Caminho do Norte e não queria passar pelo mesmo problema no Caminho Português.
Então diminui o ritmo de caminhada e aumentei o número de paradas para descanso, não que houvesse muitos locais para parar debaixo da chuva torrencial que caía, mas em cada ponto de ônibus era a oportunidade de descansar, comer e beber algo para seguir adiante.
E assim fiz até chegar aos arredores de Caxarias, onde o local indicado para pernoite era o quartel dos Bombeiros Voluntários da cidade.
Os bombeiros oferecem apenas a infraestrutura básica para o pernoite, colchão, cobertas, banheiro com água quente e um local para refeições. Pelo que me disseram o local é muito utilizado nos meses de maior fluxo de peregrinos em direção a Fátima e poucos são os peregrinos que passam por ali em direção a Santiago de Compostela.
Não me pediram e não falaram nada sobre doação, mas pelo que li no site da Associação dos Amigos dos Caminhos de Fátima o local funciona e depende das doações deixadas pelos peregrinos, então se possível deixe algo por lá.
Há outra opção de hospedagem próxima à estação do trem, Manalvo - Restaurante e Hospedaria, Rua do Manalvo n° 8, Telefone para contato: +351 249 574 161. Infelizmente eu não conhecia essa opção, como estava só e debilitado acho que teria ficado por ali.
Enfim o Caminho se faz caminhando e aprende-se muito ao caminhar. Em Caxarias todas as opções para realizar uma boa refeição são próximas também à estação de trem, como os Bombeiros Voluntários ficam no alto do morro, deve-se reservar alguma energia para a caminhada até o centro do povoado.
Alguns comentários sobre essa etapa, tem que ficar de olhos bem abertos para não perder as setas amarelas e levar em conta a direção para onde seguir, pois são quatro rotas demarcadas até o Santuário de Fátima, o Caminho de Fátima de quem vem de Lisboa, O Caminho de Nazaré a Fátima, O Caminho Fátima-Tomar e o Caminho rumo a Santiago.
Eu, particularmente, utilizei dos recursos tecnológicos que trazia comigo e abusei do uso do GPS, pois perdi as setas amarelas logo na saída do Santuário e para não ter que retornar sempre para trás, resolvi seguir as direções informadas pelo aplicativo.
Uma coisa muito interessante que aprendi com os peregrinos que passaram pelo albergue de acolhimento do Santuário de Fátima é que cada um tem o seu próprio Caminho e não deve ter dúvidas aonde se quer chegar, feito isso, todos os Caminhos seguem rumo a Santiago de Compostela, no meu caso eu deveria seguir sempre para o norte e com certeza chegarei por lá.
No mapa ilustrado na página inicial do Caminho Português você pode ver o traçado original disponibilizado pela Associação dos Amigos do Caminho de Fátima.
A seta para a próxima etapa está pintada bem ao lado do Quartel dos Bombeiros Voluntários de Caxarias, então de qualquer forma amanhã seguimos para Ansião, agora seguindo as setas amarelas!
Próxima etapa, Ansião!